Camila não é uma dessas meninas comuns, que gostam de coisas comuns, lugares comuns e etceteras comuns. Prefere a extravagância. Prefere chegar ao limite que ter de conter-se. Se não for para ser intenso, então melhor nem ser. Sempre foi assim, desde o jardim de infância. Quando convidada a ser oradora da turma em sua formatura de pré-escola declarou:
- Nascemos para bilhar! Já ficamos muitos anos parados sem descobrir o mundo que nos espera, os amores e desamores, e, principalmente, sem nos descobrirmos!
Causou perplexidade nos pais presentes e total falta de entendimento de seus colegas que, tal como Camila, beiravam os 6 anos. Uma professora comentava:
- O que o futuro não reserva para essa intempestiva menina?!
Os pais corrigiam:
- O que essa menina não nos reserva no futuro?!
Ela cresceu. Hoje vive - até demais - o que profetizara no passado. Vive o mais cru 'carpie diem'. Na idade auge dentre as idades auges que o ser humano perpassa. Ela nada perpassa, ela nada está; Ela é. E como é. Aliás, e como é! com ponto de exclamação mesmo. Mais apropriado. E eis que se chega em uma grande questão, daquelas que caem bem com reticências... o apropriado.
- Apropriado é o que manda o coração. - diz ela.
- Acho que não é bem por aí. - replica o rapaz.
- Tu acha demais.
- Tu que tem pouco medo de perder.
Ele era um cara mais comum. Do tipo que se entrete com coisas comuns, lugares assim e sem muito etcetera na vida. Tinha um carro. Com ponto final, nada de superlativo ou que mereça exclamar-se. Mas mais do que automóvel e jeito não peculiar, ele tinha culpa! Essa sim. Era sua íntima.Culpa se relaciona com perdão, com transgressão, com pensamento. Ela muda vidas.
- E tu? tem medo de perder ou de ganhar? - massacrou Camila.
Era uma pergunta profunda. Ele teria receio de deixar de lado um aconchego. Ou de abandonar o caminho aparentemente mais correto à salvação. O fato é que todos sonham com uma aventura. Mas como já bem disse o poeta: "sonho é uma coisa que eu guardo dentro do meu travesseiro". Talvez não no caso de Camila. Mas para ele, certamente. Atônito, não respondeu; silenciou um ponto e vírgula meio fora de sintaxe e foi-se embora.
Foi a última vez que se encontraram. Todas as outras vezes em que estavam num mesmo lugar se desencontravam e desconcertavam em meio a dois beijos contrangedores nas bochechas. Estava tudo tão na cara que ninguém percebia.
Ele deu sequência em uma vivência tão comum, enquanto ela deu vivência à inconsequência de si. É a vida real. Ele incessantemente guarda sonhos secretos acobertados numa ou noutra fronha. Ela acomodou-se a realizar o faz-de-conta. Ele vive o ponto final. Ela busca travessão e nova linha. O português é algo muito injusto, Camila.
quarta-feira, 22 de agosto de 2012
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